Um dedo de prosa com Dr. Sócrates




Uma das primeiras investidas nacionais, como repórter de rádio, fiz pela Rádio Princesinha, de Miracema, no já longínquo anos 80, mais precisamente em 85, eliminatórias para a Copa da Espanha/86, quando o Brasil, já classificado, enfrentaria a Bolívia, eliminada, no Morumbi.


Interessa o resultado? O Brasil, desmotivado, empatou em 1x1 com os bolivianos e uma imensa vaia se ouviu nas arquibancadas do Estádio Cícero Pompeu de Toledo. E é justamente nisto que gostaria de chegar, as vaias não atingiram ao grande ídolo corintiano, Sócrates, que saiu do gramado com aplausos particulares.


Este baita ídolo tive o prazer de conhecer na sexta-feira que antecedeu a partida, jogada em 30 de junho de 1985, nas dependências do Hotel Brasílton, em São Paulo, quando fui ciceroneado por ele enquanto aguardava José Maria de Aquino em seu trabalho para a Revista Placar.


Sentamos ao banquinho de madeira, no balcão do bar do hotel, ao lado do assessor de imprensa da CBF, Robério “Gata Mansa” Vieira, para degustar uma gelada e papear sobre futebol, noitada de boleiros, Bar Pinguim, Ribeirão Preto e até Miracema e sua Rádio Princesinha.


Foram pelo menos três horas de um ótima conversa e, no meio do papo, surgiu o zagueiro Mozer, ex-Flamengo, que ao ouvir falar da minha terrinha se levantou de onde estava, no saguão, para fazer parte de nossa prosa e lembrar de quando por lá esteve a serviço da seleção carioca de juniores, em 1983.


O papo do Brasilton terminaria com a chegada de Telê Santana, precisava gravar uma matéria especial com o treinador da seleção e não havia chances. Talvez agora, com o apoio irrestrito de Robério Gata Mansa, o assessor, eu pudesse realizar. O jornalista foi lá e voltou com um outro não de resposta, Telê não queria conversar com a imprensa.


Abrimos mais uma cerveja gelada e Sócrates sumiu da roda. “Onde foi o Magrão?” Perguntou Mozer. E o assessor de imprensa deixa a impressão que com a passagem do técnico ele deu uma escapada para fugir da bronca.


Ledo engano. Sócrates foi até onde estava Telê Santana e o trouxe pelo braço. “Este moço aqui, seu Telê, andou mais de mil quilômetros para conversar com a gente, não tem poder de uma Globo ou de uma Bandeirantes, sua rádio é pequenina e ele veio na marra, já dei minha entrevista a ele e agora é sua vez”, disse Sócrates ao comandante da seleção do Brasil.


Todo nervoso e inseguro com a presença do famoso técnico, liguei o gravador apressadamente e fiz a primeira pergunta, fugindo do assunto eliminatórias, futebol e outros assuntos que já estariam, na minha opinião, estressando o treinador brasileiro. 


Perguntei : - Como um mineiro, de família simples e sem grana, se sente em um hotel como aquele e vivendo momentos de glórias como treinador?
Foi a deixa para uma bela entrevista, que o pessoal da Rádio Princesinha me fez o “favor” de apagar, e uma prosa que continuou após o desligamento do gravador, no mesmo balcão onde eu, Sócrates, Mozer e Robério Vieira sorvíamos nossa cerveja sem medo de ser feliz.


Sócrates Brasileiro Sampaio de Souza Vieira de Oliveira reconheceu este repórter em seu primeiro jogo no Maracanã, onde estava com a Difusora , em 1986, com a camisa do Flamengo. 


Trocamos um dedo de conversa antes do jogo e prometemos uma gelada para à noite, mas infelizmente não foi possível e apenas um abraço marcou a despedida, no vestiário rubro-negro, deste que vos vala e o craque que encantou o mundo com seu futebol inteligente como ele.

Comentários

  1. Durante o jogo, na lateral do gramado do Morumbi, você ficou de costas para a cabine onde estavam as câmeras da televisão, que a todo momento marcava a presença, para o mundo, da rádio Princezinha, gravada nas costas de sua camisa. Lembra-se? rrss

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  2. Adilson, morreu o homem, mas na história ficará registrada pra sempre a sua genialidade dentro das quatro linhas. O Sócrates não foi um jogador completo, mas chegou perto, e completo seria se tivesse levado mais a sério a profissão de atleta profissional. O futebol pra ele foi uma grande diversão! Desfilava com elegância carregando a bola junto aos pés com a cabeça erguida e procurando o companheiro melhor colocado, desferindo um lançamento de longa distância ou um toque de calcanhar genial, que poucos fizeram ou fazem com tanta perfeição. Formou com Zico uma dupla quase perfeita na Seleção, a partir de 1979, que só faltou um título mundial para coroar a carreira de ambos. O domingo amanheceu mais triste com a notícia de sua morte; o futebol se despede de um doutor da bola; o Brasil perde um cidadão que abraçou a causa e lutou pela democracia, não só corintiana, mas também na política do nosso país. Descanse em paz, Doutor da bola!

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