Qualquer semelhança é mera coincidência

Neste final de semana, em Atafona, me encontrei com um antigo editor, companheiro de redações, um jornalista ativo e inteligente, que me fez recordar uma bela e triste matéria, feita em um circo aqui na cidade, que chegara precedido de grande fama e que na primeira noite fez um espetáculo deprimente quando seus artistas foram vaiados e, pelo menos na nossa opinião, em fato jamais visto na cidade ou na região. 

Eu havia chegado no jornal a poucos meses e ainda buscava afirmação, fui trabalhar no geral e a matéria sobre as vaias e o espetáculo vaiado caiu no meu colo. O que fazer? Me perguntava enquanto saia do jornal até a Av 28 de março, onde o circo estava armado. 

Falo com os artistas? Falo com o diretor?  com o gerente geral? Confesso que estava perdido e, quando estacionamos o veículo, com o timbre do jornal nas portas laterais, dois artistas estrangeiros, um argentino e outro russo, vieram falar conosco, eu e o fotógrafo. 

- Vocês vieram, falou o argentino em um bom portunhol, por conta das vaias de ontem, certo? Isto nunca aconteceu, mas o culpado é o diretor geral, que não gosta de estrangeiros e não deixa a gente trabalhar preferindo dar chances aos artistas veteranos, que ele contratou de outros circos que gerenciou e o resultado é este, é trapezista caindo, malabarista sem habilidade e até palhaços sem graça, disse o artista de Córdoba, na Argentina. 

Fui ao diretor, que imediatamente me botou em contato com o dono do circo e evitou falar sobre as críticas e as denúncias dos artistas estrangeiros. Cheguei ao dono e fui muito bem recebido,vinho, cafezinho, torradas, um bom requeijão e uma boa prosa, o homem tinha domínio do assunto e era bem falante e simpático. 

- Assumi este circo com dívidas aterrorizantes, disse ele, paguei todos os impostos, refinanciei as lonas e as novas arquibancadas, não devemos nada ao Imposto de Renda ou a Estado ou a União, estamos quites e vamos, em breve, ser o maior circo do mundo graças a nossa grande plateia, que nos respeita apesar das vaias de ontem, que aliás foi consequência de um trabalho de um novo diretor, que ainda não está adaptado e do gerente geral, que é um trapalhão. 

Fui ao gerente geral, afinal o dono do cicro o criticou, e o moço, recentemente contratado, me fala, sem medo de demissão ou de perseguição por parte dos donos e dos artistas. 

- Moço, o diretor contratou dois leões, segundo ele  a garantia do espetáculo, mas dois leões velhos, cansados e machucados, sem qualquer espectativa de recuperação, e você viu ontem? Falharam em todos os movimentos e não tiveram ajuda do domador, que foi tirado de cena pelo palhaço que o fez sair antes do fim. Os leões um dia fizeram sucesso, mas hoje.... Encerrou a rápida entrevista o gerente geral. 

Enquanto me preparava para deixar o lugar veio a meu econtro um outro gringo, acho que alemão ou que já trabalhou por lá, seu sotaque era germânico.

- Preciso falar com vocês, disse ele, quero desabafar e tirar a responsabilidade das minhas costas, estão dizendo que eu fui o culpado pelas vaias, as facas caíram das minhas mãos nas três tentativas que fiz para me exibir, mas a culpa é da minha parceira, ela fica estática e não dá dicas para eu lançar as facas, todos querem me ver acertando o alvo mas estou com problemas sérios e ninguém vê, vê só aquele ali, apontou para o rapaz ao lado, pensa que sabe tudo e que pode ser um grande artista, o diretor gosta dele e é sempre colocado no lugar do malabarista, que é um baita dominador de bolas e arcos, e fica só na espera. Arrematou. 

Sai e fui para a redação e fiz uma matéria elogiosa, afinal eles diziam que era o melhor circo do Brasil e mais conhecido em todo país e um espetáculo ruim não iria influir no prestígio da casa, mas seria preciso mudar muita coisa e o dono deixar de ser ganancioso, ganhar menos e colocar mais dinheiro para os artistas novos que poderiam render muito mais em favor do grupo e dos fãs. 
E o meu editor, no final da prosa, já saboreando um bom vinho italiano, que lembrava aquele vinho que o dono do circo me serviu durantre a entrevista, disse? - Dutra, esta história não parece com a história daquele seu time? 

É, pode ser, mas como dizem por aí, qualquer semelhança é mera coincidência.

Comentários

  1. Por tudo isso ele é a maior torcida do Brasil. A maioria dos brasileiros gosta de palhaçada, tanto no futebol como na política, menos no circo.

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  2. Adilson, seu blog é lido, segundo sua informação, por milhares de seguidores e portanto aqui, quando escreve, não atende a "opiniões" de editores ou redatores ou diretores de um jornal, segue sim, a sua, que pode ter ou não consenso ou razão para nós seguidores. Por esse motivo vou usar suas próprias palavras: "matéria elogiosa, afinal eles diziam que era o melhor circo do Brasil e mais conhecido em todo país e um espetáculo ruim não iria influir no prestígio". Esse é o Flamengo.

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